A nova lei do divórcio, que entrou em vigor a 1 de Dezembro último (lei n.º 61/2008, de 31 de Outubro) trouxe alguns problemas do ponto de vista prático. Acabou com o divórcio litigioso e o conceito de "culpa" (fim a um conceito que imperou na ordem jurídica portuguesa) mas introduziu inovações, como os "créditos de compensação", e criou focos de litígio sobre, por exemplo, as responsabilidades parentais.
Além disso, a nova lei (associada à actual crise económica e imobiliária) é um cocktail explosivo quando se trata de dividir bens do casal. Até se pode dar o caso de, em última instância, o casal ser divorciado de facto (no papel) e de se ver na contingência de ter de partilhar o mesmo tecto, por um dos cônjuges não ter para onde ir ou haver dificuldades na venda do apartamento comum.
Não fosse a dissolução do casamento um assunto sério e diríamos que já nem a 'casa da sogra' salva a situação. Deixa de ser necessário alegar e provar a culpa de uma das partes no rompimento da relação, mas transporta-se o litígio para outra esfera (a patrimonial e a tutela dos filhos) que tem de ser aferida em processos autónomos. As alterações relativas à atribuição de pensão de alimentos, aos créditos de compensação por quem "manifestamente" (diz a lei) contribuir "mais do que era devido para os encargos da vida familiar" ou ainda ao princípio do exercício conjunto das responsabilidades parentais são as áreas que suscitam mais dúvidas, sobretudo na forma como será feita a sua aplicação prática. Não falta quem anteveja ainda mais litígios face às dificuldades esperadas e quem aponte que a nova lei fragiliza ainda mais a posição da parte mais fraca. E não se esqueça que, mais do que bens a dirimir num divórcio, muitas vezes o que há a dirimir são dívidas contraídas pelo casal ou por um dos cônjuges.
O que mudou? Antes era preciso esperar três anos de separação de facto para requerer o divórcio, agora só é preciso esperar um ano. Criou-se o divórcio por mútuo consentimento ou a pedido de apenas umas das partes desde que se respeite quatros condições: a separação de facto por mais de um ano; "alteração das faculdades mentais do outro cônjuge, quando dure há mais de um ano e, pela sua gravidade, comprometa a vida em comum"; "a ausência, sem que do ausente haja notícias, por tempo não inferior a um ano"; "quaisquer outros factores que, independentemente da culpa dos cônjuges, mostrem a ruptura definitiva do casamento". E neste último conceito cabe tudo, desde o 'querida já não te amo!' até 'estás mais gordo, quero o divórcio!'. O ponto da alteração das faculdades mentais também dá pano para mangas.
A nova lei do divórcio, ao contrário da anterior, estabelece a cessação da afinidade. Isto é, quem se divorciar 'perde' também os sogros, cunhados, enteados ou quaisquer outros parentes do ex-cônjuge, o que tem implicações na esfera laboral (regime de faltas justificadas). Quanto aos efeitos patrimoniais na nova lei do divórcio temos o seguinte: A partilha passará a fazer-se como se os cônjuges tivessem estado casados em comunhão de adquiridos, mesmo que o regime convencionado tivesse sido a comunhão geral - são bens próprios do cônjuge os levados para o casamento, são comuns os adquiridos na pendência do casamento. Além disso, a lei introduz um novo princípio: "Se a contribuição de um dos cônjuges para os encargos da vida familiar exceder manifestamente a parte que lhe pertencia (...), esse cônjuge torna-se credor do outro "pelo que haja contribuído". Esse "crédito" só pode ser exigido no momento da partilha dos bens.
No que toca ao regime da responsabilidade parental, diminui-se a pena numa eventual subtracção de menor (por parte do cônjuge que não ficou com a tutela), mas alargam-se as situações passíveis de ser sancionadas. Ainda em relação às "responsabilidades parentais", expressão que substitui o "poder paternal", a nova lei impõe "o seu exercício conjunto", salvo quando o tribunal entender que este regime é contrário aos interesses do filho. O tribunal determinará a residência do filho e os direitos de visita de acordo com o interesse deste.
A nova lei prevê ainda que quem falhar a prestação de alimentos durante dois meses a seguir ao prazo fixado é punido com multa até 120 dias (pena agravada se o comportamento for intencional, reincidente ou reiterado).
No processo de divórcio sem consentimento de um dos cônjuges haverá sempre uma tentativa de conciliação que, se não resultar, passa ao patamar do eventual acordo por mútuo consentimento. Se este também não resultar, o juiz que decida.
Relembre-se que o Presidente da República, Cavaco Silva, expressou dúvidas em relação a este diploma mas acabou por promulgá-lo, muito embora no texto da promulgação tenha mencionado o desejo de que a aplicação prática da lei seja "acompanhada de perto pelo legislador, com o maior sentido de responsabilidade e a devida atenção à realidade do país".
Sem comentários:
Enviar um comentário