domingo, abril 13, 2008

O que vale mais num casamento os afectos ou o contrato entre o casal?



O projecto de lei do PS que altera o regime jurídico do divórcio fundamenta-se na verificação de "três grandes movimentos nas sociedades modernas a sentimentalização, a individualização e a secularização da vida conjugal". O articulado surgiu dos contributos da socióloga Anália Torres e do jurista Guilherme Oliveira, que defendem que "a afectividade passou a estar no centro da relação".
Mas Rita Lobo Xavier, especialista em Direito da Família e professora na Universidade Católica do Porto, apresenta uma "discordância de fundo" relativamente a esta forma de encarar o casamento. Em declarações ao JN, a jurista sublinha que "a relação sentimental não é o núcleo fundador do casamento como instituição".
"O direito nunca pode ter a tutela dos afectos", sustenta, realçando o paradoxo entre o que designa como a "juridificação dos afectos", por um lado, e a "desjuridificação dos deveres conjugais", por outro.
A especialista saúda, porém, com optimismo alguns aspectos do projecto socialista, designadamente os que se prendem com as responsabilidades parentais, conceito que prefere ao de poder paternal. Segundo a jurista, "a guarda conjunta aplicada apenas aos actos de particular importância é bem vinda", mas tem dúvidas sobre a sua imposição como regra geral. Do mesmo modo, a jurista Isilda Pegado, ex-deputada independente nas listas do PSD e membro da Associação Mais Família, realça que "se tem visto que o exercício comum das responsabilidades parentais não funciona do ponto de vista prático".
Responsabilidade.
Ambas vêem com bons olhos a punição do incumprimento das responsabilidades para com os filhos (passa a constituir crime de desobediência nos termos da lei penal), mas Rita Lobo Xavier questiona como será concretizado o princípio. "A ideia de que basta passar uma certidão de óbito ao casamento para reconstituir outro projecto de vida não condiz com a realidade da maioria das famílias portuguesas, endividadas, cujos rendimentos podem não ser suficientes para permitir o cumprimento de responsabilidades para com os filhos da primeira relação", salienta, contestando, no entanto, a possibilidade do crime ser punível com pena de prisão.
Associada a esta ideia, a jurista vai mais longe "O sinal que gostaria que passasse para o país é o de que a pessoa tem que ser, até ao fim, responsável pelas suas primeiras responsabilidades da verificação da ruptura".
Quanto à atribuição de créditos de compensação ao membro do casal divorciado que contribuiu manifestamente mais do que lhe era devido para os encargos da vida familiar, Rita Lobo Xavier não vê inconvenientes, mas Isilda Pegado contesta a ideia de que "um se torne o credor do outro". "Isto vem trazer muito mais conflitualidade", defende, acrescentando que no artigo sobre a "reparação de danos" (1792º do projecto de lei) "se verifica que, afinal, a culpa permanece como causa do divórcio mas aplicada em termos de sanções económicas e dirimida noutras instâncias".
Ler noticia integral em Jornal de Noticias, de 13-04-2008.

Sem comentários: