Dulce Rocha quer ver consagrado na lei o "direito da criança às relações de afecto profundas" e à "continuidade dos afectos". A vice-presidente do Instituto de Apoio à Criança tem pronto um documento, que deverá ser tornado público em Dezembro, no qual reivindica uma alteração da lei de protecção de menores: "A lei já enumera uma série de situações nas quais o Estado tem legitimidade para intervir, por exemplo no caso de maus tratos, mas não está expressamente mencionado o caso de uma criança entregue a cuidados prolongados a outrem e que, um dia, é reivindicada pelos pais biológicos."
Apesar de a magistrada deixar claro que não se estava a referir concretamente ao caso de Esmeralda, mas "aos vários casos que existem mas não são conhecidos", toda a audiência que a ouviu, ontem, no Montijo, no I Fórum Abrigo "Crianças em Risco - Que Futuro?", se lembrou imediatamente do caso de Torres Vedras. "Uma criança pequena estabelece vínculos muito rapidamente, por isso temos de evitar a descontinuidade afectiva que pode causar graves danos", afirmou, acrescentando: "Não é lícito que a lei ignore os de--senvolvimentos da psicologia do de--senvolvimento e da psicologia social. Hoje sabemos que a saúde não é só o bem-estar físico e uma criança que é afastada daqueles que cuidaram dela está em perigo psicológico."
Dulce Rocha alertou ainda para o facto de muitos destes casos serem tratados como "processos de regulação do exercício do poder paternal" quando, na verdade, "não houve qualquer exercício do poder paternal". "Isto não faz sentido", disse, concluindo que, muitas vezes, em Portugal, se tem demasiada esperança na família e que, em certas situações, é preciso ter a coragem de desistir das famílias biológicas.
Uma ideia, aliás, que já tinha sido aflorada por outro dos oradores neste fórum, o juiz-conselheiro Laborinho Lúcio: "A família não é o conjunto dos progenitores da criança, isso não basta", afirmou. Nesse sentido, "a adopção não existe como alternativa à família. A adopção existe porque não há família. A família adoptiva é a única família".
Por isso, Laborinho Lúcio não hesitou em dizer: "Só as crianças adoptadas são felizes. Para bem delas, na maioria dos casos, as crianças são adoptadas pelos pais biológicos, antes ou depois de nascerem. Se não, a única coisa que fizeram foi garantir a produção biológica" e isso não basta para serem considerados pais.
Fonte: Diário de Noticias, de 15-11-2007.
Fonte: Diário de Noticias, de 15-11-2007.
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