A falta de condições de trabalho é, precisamente, o problema mais grave com que os magistrados, advogados e funcionários judiciais têm que lidar todos os dias.
O cenário é nacional, mas assume particular incidência na Madeira, onde um tribunal, o de Santa Cruz, chegou mesmo a encerrar.
Tectos a cair, edifícios onde chove dentro, falta de espaço, sistemas de climatização que não funcionam, falta de salas de audiência e de salas de testemunhas, aparelhos de som e de videoconferência que não funcionam, reflectem o estado dos tribunais na Região.
O pior exemplo é, porventura, o Palácio da Justiça, no Funchal.
O edifício é de 1964, numa altura em que a legislação ainda não contemplava a eliminação das barreiras arquitectónicas. Passados 40 anos, a acessibilidade a estes serviços públicos continua a ser um problema para alguns cidadãos.
Para quem ali trabalha, o sistema de ar condicionado constitui outro estorvo e uma dificuldade que, no Verão, chega mesmo a ser dramática.
De acordo com a presidente do Tribunal Judicial do Funchal, são já dez anos de ofícios enviados para o Ministério da Justiça e uma resolução que tarda a chegar.
Primeiro, porque a instalação eléctrica não comporta um novo equipamento. Depois, porque a estética não comporta a nova instalação.
Uma situação que se torna mais problemática, pelo facto de neste 'Palácio' a maior parte dos julgamentos e outras diligências decorrerem a portas fechadas nos gabinetes dos magistrados.
"É que três salas de audiências não chegam para todo o serviço", explicou Joana Dias.
Para além do espaço reduzido e atafulhado, a juíza queixa-se da falta de uma sala de testemunhas.
"É uma rebelaria", salientou, reforçando que as pessoas entram, saem, falam umas com as outras, por não haver locais próprios para interrogatórios.
A falta de segurança contra a violência e intrusão é outro dos aspectos mais criticados e já levou a presidente do Tribunal Judicial do Funchal a fazer mais uma exposição ao Ministério da Justiça. Num edifício onde não há policiamento e não existe possibilidade de detectar se alguém entra com uma arma, um engenho explosivo ou qualquer outro objecto perigoso, a juíza já apanhou alguns sustos valentes.
"Ainda há bem pouco tempo, um indivíduo saiu da cadeia e veio bater-me à porta", recorda. O caso não teve consequências de maior, porque se tratava apenas de um pedido de emprego, mas sem qualquer tipo de segurança ou detector de metais, a integridade física pode estar em causa. "Até porque fui eu que o meti na cadeia", reforçou.
A falta de policiamento é uma das matérias mais sublinhadas pelos juízes com que o DIÁRIO falou.
Paulo Gouveia não se queixa das condições de trabalho nos tribunais onde diligencia. A Vara Mista, no remodelado Palácio dos Cônsules, e o Tribunal Administrativo, no Edifício 2000, são recentes e oferecem boas condições. Mas aqui falta também o policiamento.
Segundo o magistrado, 90% dos tribunais do país têm falta de segurança, porque não há polícias, nem segurança privada.
Há tribunais em que os juízes andam no mesmo elevador que o réu que vai julgar a seguir ou que julgou antes, reforçou.
"Lembro-me que no tribunal onde estagiei, em Setúbal, partilhei várias vezes o elevador com pessoas que tinha acabado de condenar", disse.
Salientando que os tribunais não mandam em nada que tenha a ver com recursos ou instalações, Paulo Gouveia lembra que estas são competências do Ministério da Justiça.
"Dinheiro há, como todos sabemos. Mas há a questão de prioridades", critica.
A má qualidade dos sistemas de videoconferência, registo de prova em julgamento e sistema informático é outro dos problemas enunciados pelo juiz.
"As condições de gravação dos julgamentos são uma tristeza, porque os aparelhos são antiquados e as condições medíocres", queixou-se, realçando que já houve julgamentos que tiveram de ser repetidos, porque depois seguem recurso e o Tribunal da Relação não consegue ouvir, ou porque sem a gravação da prova o julgamento fica sem validade.
Uma situação que, sublinhou, resolvia-se com uma câmara de filmar e bons microfones.
"Em vez disso temos cassetes, pelo que muitas vezes temos de pedir às pessoas para pararem o seu testemunho, porque temos de mudar de cassete.".
Um problema que, de acordo com António Roovers, também se verifica no tribunal de São Vicente.
Segundo o secretário de Justiça, o problema com o equipamento de som obriga muitas vezes os técnicos a se deslocarem até ao funchal, só para fazer cópias das gravações.
No que corresponde aos equipamentos, as queixas vão também para a questão da banda larga.
"Com a quantidade de aplicações de informática que usamos hoje em dia, os programas já se tornam mais lentos, pelo que a banda larga também tem de ser aumentada.", referiu.
Mas a principal dificuldade com que se depara este tribunal não tem propriamente a ver com os equipamentos electrónicos.
O edifício foi construído nos anos 30, mas foi alvo de remodelações em 2000. Todavia, no Tribunal de São Vicente chove lá dentro.
"Se o dia estiver ventoso, as telhas levantam e temos infiltrações de água", explicou o secretário de Justiça, salientando que já foram enviados vários ofícios para o Ministério a fim o problema ser resolvido. Em dois anos, a situação não mudou.
Entretanto, está em estudo, há cerca de três anos, a construção de um novo tribunal para São Vicente.
Existe, mesmo, um projecto entregue na Câmara municipal, mas os terrenos onde deveria ser construído o novo edifício está, neste momento, ocupado por um parque de estacionamento.
"Mas esse parque é provisório. Pelo menos, até decidirem se se constrói ou não um novo tribunal", acrescentou António Roovers.
Mais uma vez, esta é uma matéria que apenas o Ministério da Justiça poderá decidir ou não.
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