Prof. Eduardo Sá
Mais do que uma família biológica o que uma criança precisa é de uma família afectiva. Para uma criança crescer feliz necessita de uma família que a ame, cuide, acarinhe e eduque. É com base nesta concepção, centralizada na figura da criança, que o Código Civil de 1966 introduziu, no nosso direito de família, o instituto da adopção. O artigo 1586º do Código Civil define a adopção como “o vínculo que, à semelhança da filiação natural, mas independentemente dos laços de sangue, se estabelece legalmente entre duas pessoas”.
A adopção só pode ser decretada quando se verifiquem cumulativamente, as seguintes condições:
a) Apresentar a adopção reais vantagens para o adoptado;
b) Fundar-se a adopção em motivos legítimos;
c) Não envolver a adopção um sacrifício injusto para os outros filhos do adoptante;
d) Ser razoável supor que entre o adoptante e o adoptado se estabelecerá um vínculo semelhante ao da filiação, devendo para tanto o adoptado ter estado ao cuidado do adoptante durante um prazo suficiente para que haja oportunidade de avaliar esse vínculo.
Existem dois tipos de adopção:
Adopção plena em que o adoptado adquire a situação de filho do adoptante e se integra na sua família, extinguindo-se as relações familiares entre o adoptado e a sua família biológica, sem prejuízo do disposto quanto a impedimentos matrimoniais. O adoptado perde os seus apelidos de origem, adquire os apelidos do adoptante ou adoptantes e em determinadas condições o nome próprio do adoptado pode ser modificado, pelo tribunal, a pedido do adoptante. A adopção plena é irrevogável mesmo por acordo entre o adoptante e o adoptado. Os direitos sucessórios dos adoptados são os mesmos dos descendentes naturais.
Adopção restrita em que o adoptado conserva todos os direitos e deveres em relação à sua família natural, salvo as restrições estabelecidas na lei. Cabe exclusivamente ao adoptante ou ao adoptante e seu cônjuge, se este for pai ou mãe do adoptante, o exercício do poder paternal, com todos os direitos e obrigações dos pais. No caso da criança possuir bens próprios o seu adoptante só pode despender os rendimentos desses bens no montante fixado pelo tribunal para alimentos da criança. O adoptado pode receber nomes do adoptante, a requerimento deste, compondo um novo nome que terá que ter um ou mais apelidos da família natural. A adopção restrita pode a todo o tempo, a requerimento dos adoptantes, ser convertida em adopção plena, desde que se verifiquem os requisitos desta e é revogável por decisão judicial. O adoptado, ou seus descendentes e os parentes do adoptante não são herdeiros legítimos ou legítimários uns dos outros, nem se encontram vinculados reciprocamente à prestação de alimentos, assim como o adoptado não é herdeiro legitimário do adoptante, nem este daquele.
Podem adoptar plenamente:
a) Duas pessoas casadas (e não separadas judicialmente de pessoas e bens) ou em união de facto há mais de 4 anos, se ambas tiverem mais de 25 anos – Adopção plural e conjunta;
b) Uma pessoa, individualmente com mais de 30 anos ou, se o adoptando for filho do cônjuge do adoptante ou companheiro, com mais de 25 anos – Adopção singular.
Em qualquer caso a idade máxima para adoptar é de 60 anos à data em que o menor lhe tenha sido confiado, mediante decisão judicial ou administrativa, sendo que a partir dos 50 anos a diferença de idades entre o adoptante e o adoptando não poderá ser superior a 50 anos, salvo se o adoptado for filho do cônjuge. Pode adoptar restritamente todo aquele que tiver mais de 25 anos e menos de 60 anos à data em que o menor lhe tenha sido confiado, salvo se o adoptando for filho do seu cônjuge.
Em qualquer caso só podem ser adoptados os menores, filhos do cônjuge ou companheiro do adoptante e aqueles que foram confiados judicial ou administrativamente, ao adoptante com menos de 15 anos à data da petição judicial de adopção. Podem ainda ser adoptados os menores de 18 anos, não emancipados, quando desde não superior a 15 anos, tenham sido confiados ao adoptante ou quando for filho do cônjuge ou companheiro do adoptante. Para que se constitua o vínculo da adopção torna-se ainda necessário o consentimento das seguintes pessoas:
a) Do adoptando, quando maior de 12 anos;
b) Do cônjuge do adoptante não separado judicialmente de pessoas e bens ou do companheiro do adoptante;
c) Dos pais do adoptando, ainda que menores e mesmo que não exerçam o poder paternal, desde que não tenha havido confiança judicial nem medida de promoção e protecção da confiança a pessoa ou a instituição com vista a futura adopção;
d) Do ascendente, do colateral até 3º grau ou do tutor quando, tenham falecido os pais do adoptando e este o tenham a seu cargo e com ele viva;
e) Do tutor ou parente, no caso previsto no artigo 1978º, n.º 2 do Código Civil, desde que não tenha havido confiança judicial nem medida de promoção e protecção da confiança a pessoa ou a instituição com vista a futura adopção;
f) Da pessoa ou pessoas que adoptam (nunca pode ser dispensado).
Acresce que a mãe não pode dar o seu consentimento antes de decorridas 6 semanas após o parto.
O Tribunal pode dispensar o consentimento das pessoas que o deveriam prestar nos seguintes casos:
a) Se estiverem privadas do uso das faculdades mentais;
b) Impossibilidade de contacto;
c) Situações que permitiriam a confiança judicial; d) Inibição do exercício do poder paternal.
O processo de adopção inicia-se quando o pretendente comunica aos serviços da segurança social da sua área de residência a sua intenção de adoptar. No prazo de 6 meses e depois de proceder a uma avaliação social e psicológica do candidato é emita uma decisão. O candidato, que tiver sido seleccionado, fica a aguardar que lhe seja proposta a adopção de uma determinada criança. Apresentada a proposta, segue-se um período que tem por objectivo o conhecimento e aceitação mútuos entre a criança e o candidato a adoptar.
Concluída favoravelmente esta fase, a criança é confiada ao candidato a adoptante, ficando em situação de pré-adopção por um período não superior a 6 meses, durante o qual a entidade competente procede ao acompanhamento e avaliação da situação. Verificadas as condições para ser requerida a adopção é elaborado um relatório que é remetido ao candidato. Quando o pedido de adopção for apresentado ao Tribunal de Família e de Menores competente deve ser acompanhado do referido relatório, o processo fica concluído depois de proferida a sentença.
Finalizo, dizendo que a decisão de confiar uma criança a uma família que não a família biológica não é uma atitude contra os pais, mas a favor da criança.
Mário Rodrigues da Silva
Texto publicado no Jornal da Madeira, de 27-12-2006.
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