terça-feira, janeiro 22, 2008

Advogados contestam nova lei das defesas oficiosas


Há uma onda de contestação à portaria que regulamenta a nova lei do acesso ao direito, ou seja, do apoio judiciário e da consulta jurídica. A lei entrou em vigor a 1 de Janeiro de 2008 e a portaria da polémica foi assinada pelo secretário de Estado da Justiça na véspera de Natal.

Dizem os advogados que as novas regras são inaceitáveis e o novo bastonário da Ordem dos Advogados (OA), António Marinho Pinto, já veio a terreiro propor a suspensão da lei n.º 47/2007 e respectiva regulamentação. O Conselho-Geral da OA também já veio a público contestar o facto de a nova fórmula (lotes de 10, 20, 30 e 50 processos ou nomeação isolada de processos, uma vez esgotados os lotes) incluir no valor dos honorários as despesas efectuadas pelos advogados.

Os causídicos consideram intolerável que o Estado proponha pagar as defesas oficiosas por lotes de processos. Fórmula que reduz drasticamente a remuneração dos advogados que prestam serviço oficioso. Além disso, co-responsabiliza ainda mais os patronos pelos actos praticados pelos estagiários, o que poderá levar a que os advogados recusem receber estagiários nos seus escritórios. E mais, o Estado pretende pagar 25 euros aos advogados por consulta jurídica mas faz o cidadão reembolsar 30 euros caso se apure não ter apoio judiciário.

Dizem os advogados que a indignação não é feita por defesa corporativa da classe mas em nome das pessoas que não têm possibilidades para contratar um advogado. Temem que haja uma debandada às defesas oficiosas que, nos moldes actuais (cerca de 100 euros por cada processo), já são pagas tarde e a más horas. Há atrasos na Madeira.

Nas contas da OA, os advogados que, por exemplo, prestam apoio judiciário (defendem cidadãos com baixos rendimentos) em lotes de 50 processos recebem, de dois em dois meses, 640 euros. Enquanto durar o processo, o Estado paga ao advogado, por processo, 6,40 euros por mês. Independentemente do número de vezes que o advogado tenha de ir ao tribunal, das contestações, participações, da presença em interrogatórios e julgamentos. As deslocações ou qualquer despesa no âmbito do processo (anteriormente pagas à parte) estão agora incluídas nos 6,40 euros.

O representante madeirense no Conselho-Geral da OA, Simplício Mendonça, confirmou a contestação e a posição do Conselho-Geral que fez votos para que, no prazo de 60 dias, a situação seja revista. Simplício Mendonça disse ser inaceitável o apoio judiciário nestas condições.

Já José Prada (filho), membro eleito do Conselho Distrital da OA, diz que a classe tem reagido de forma isolada. Considera inaceitável que se junte despesas e honorários no mesmo saco. "Se o advogado tiver de se deslocar ao Porto Santo, os honorários não dão para a despesa", concluiu. José Prada garantiu que não é desta forma que se põe o enfoque no cidadão a quem se pretende prestar um melhor acesso à Justiça.

Trabalhar à borla.

O advogado Américo Dias já fez as contas. Nos novos moldes, um processo em lote custa, por ano, ao Estado, 78 euros para o advogado. Agora custa mais de 100 euros por processo. "Mais grave é incluir nos honorários as despesas", lamentou. Sendo que as despesas passam a ser tributadas como honorários.

O causídico faz o paralelismo com outras classes afirmando que os 50 euros líquidos que ganharia anualmente com um processo é o preço de uma consulta médica. "São valores que, sem desprestígio para um pintor, um pedreiro ou um electricista, coloca os advogados a ganhar, à hora, menos do que um trabalhador indiferenciado", disse.

Américo Dias concorda com a suspensão da lei e recusa-se "a trabalhar à borla para o Estado" que está nesta cruzada "com um objectivo economicista". Lamenta que a OA tenha sido informada na véspera de Natal e que o Ministério não tenha esperado por parecer.

Para Américo Dias, se a ideia do Estado é assalariar advogados, então que crie a figura do defensor oficioso público como existe no sistema anglo-saxónico.

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