Infelizmente a delinquência juvenil está na ordem do dia. Segundo o último estudo conhecido, a PSP registou, só em 2005, 2967 processos de delinquência, mais 188 casos que no ano anterior. Esse estudo demonstra que há cada vez mais jovens autores de crimes, há cada vez mais pessoas vítimas de crimes praticados por menores e é nas zonas periféricas das grandes cidades, sobretudo de Lisboa e do Porto, que habitam os principais grupos de delinquentes.
Como principais factores da delinquência juvenil são tradicionalmente apontados os seguintes:
• a disfunção familiar que é considerado o factor mais importante, devendo realçar-se a este nível o mau exemplo dos pais, a falta de autoridade, designadamente paternal, porque o pai não existe, está ausente ou não intervém; a falta de transmissão de valores, porquanto os pais estão demasiado absorvidos pela profissão e deixam os filhos entregues a si próprios e os desequilíbrios ao nível afectivo, por excesso de protecção ou falta de afecto. A ausência do pai com a consequente impossibilidade dos rapazes se identificarem com padrões masculinos de referência como o apoio à mãe, a autoridade, o estabelecimento de regras e limites é considerada como uma das causas mais comuns de trajectos delinquentes;
• a falta de supervisão, de acompanhamento por parte dos pais, de disciplina adequada assim como os conflitos, o comportamento criminoso dos pais e uma atitude complacente para com a delinquência;
• a violência familiar;
• a pobreza familiar;
• a inactividade dos pais que em muitos casos vivem dependentes de subsídios, como o Rendimento de Inserção Social e o subsídio de desemprego;
• o abandono emocional dos filhos, sendo a indiferença a sua pior forma;
• os distúrbios mentais quer dos filhos, quer dos pais;
• o insucesso, absentismo e abandono escolar resultantes, muitas vezes, do facto de os pais não terem estudado e de não acharem importante que os seus filhos estudem;
• o rápido crescimento físico dos jovens sem ser acompanhado por uma maturidade afectiva, intelectual ou psicossocial;
• a incapacidade de lidar com situações frustrantes;
• o consumo de álcool e de drogas;
• experiências sexuais precoces, note-se que no que toca a mães com idades inferiores a 16 anos Portugal ocupa o 2.º lugar na Comunidade Europeia, atrás do reino Unido, com 7.000 bebés filhos de mães adolescentes por ano. Se contabilizarmos as mães precoces até aos 16 anos estamos mesmo em primeiro lugar;
• a sociedade permissiva em que o jovem exige tudo dos outros e nada exige de si próprio;
• a banalização de sentimentos como a angústia e o tédio, com o desaparecimento das referências culturais, éticas, religiosas e humanistas tradicionais;
• o ambiente específico de certos meios sociais de risco, onde a pobreza, o isolamento, a delinquência e a prostituição estão presentes diariamente;
• a influência da TV e da Internet, sendo que a criança quanto mais pequena mais vulnerável é em termos emocionais. A TV tornou-se a mais popular baby-sitter de muitas famílias não só em Portugal como no resto do mundo. As formas de delinquência juvenil mais comuns são:• a delinquência tradicional de apropriação;
• o vandalismo em bando;
• a violência escolar;
• o “hooliganismo”;
• a violência racista;
• a criminalidade lúdica em que o jovem transgride para quebrar a monotonia (ex: graffitis nas paredes):
• o “bullying” em que um jovem ou um grupo de jovens pratica actos de violência física ou psicológica intencionais e repetidos, com o objectivo de intimidar ou agredir outro indivíduo (ou grupo de indivíduos) incapaz de se defender;
• a “happy slapping” em que os jovens agridem física ou sexualmente, um qualquer transeunte ou utente do transporte público e os seus companheiros filmam a cena com os seus telemóveis e divulgam-na pela Internet, para ser partilhada.
Segundo o artigo 19.º do Código Penal Português só quem tiver 16 anos ou mais é responsável penalmente.
No caso de actos qualificados como crimes praticados por menor de 12 anos, a resposta do sistema judicial passa por uma intervenção social de solidariedade e protecção não punitiva, com a instauração de um processo de promoção e protecção nas Comissões de Protecção de Crianças e Jovens em Risco ou nos Tribunais. Entende-se que a criança está numa situação de perigo.
No caso de “crimes” cometidos por jovens com mais de 12 anos e menos de 16 anos, os mesmos são julgados à luz do sistema tutelar educativo que aplica as medidas consideradas adequadas à idade dos jovens. O objectivo destas medidas é a educação do menor para o direito com a sua consequente inserção de forma digna e responsável na sociedade. As medidas tutelares encontram-se tipificadas no artigo 4.º da Lei n.º 166/99, de 14 de Setembro e são as seguintes: a admoestação;• a privação do direito de conduzir ciclomotores ou de obter permissão para os conduzir; a reparação ao ofendido; a realização de prestações económicas ou de tarefas a favor da comunidade; a imposição de regras de conduta; a imposição de obrigações; a frequência de programas formativos; o acompanhamento educativo; e o internamento em centro educativo, que pode funcionar segundo o regime aberto, semiaberto ou fechado.
Os maiores de 16 anos que não tenham completado 21 anos e que cometam crimes, beneficiam de um regime especial que estipula a possibilidade de aplicação, em certas condições, de medidas pensadas para os inimputáveis em razão da idade e consagra um principio de atenuação especial da pena de prisão sempre que razões de reinserção social o aconselhem — DL n.º 401/82, de 23 de Setembro.
Convém ainda referir que os menores e as pessoas obrigadas a vigiá-los podem vir a ser responsabilizadas civilmente pelos danos causados a terceiros pelos menores — artigos 483.º, 488º, 489.º e 491.º do Código Civil.
A delinquência juvenil é uma questão social e como tal é também uma questão política que reclama a implementação de medidas de prevenção que combatam a delinquência juvenil através de políticas integradas. Na verdade os jovens têm uma grande necessidade de afirmação enquanto pessoas e quando não encontram forma de se afirmarem de forma positiva fazem-no de forma negativa. Daí a necessidade de implementar medidas que promovam o apoio às famílias, o combate ao consumo de bebidas alcoólicas e de estupefacientes, a criação de redes de terapia e mediação familiar, o apoio à educação, a cultura de não-violência, as boas condições habitacionais, uma intervenção atempada das Comissões de Protecção de Menores e Jovens em Risco, dos Tribunais e das instituições de saúde sobretudo das especialidades de saúde mental infantil e juvenil. No combate à delinquência Juvenil a escola tem um papel fundamental pelo que deverá ser uma escola inclusiva e exigente, com estratégias positivas quanto a comportamentos, promovendo atitudes e medidas anti-bullying em que através do castigo, compromisso, negociação, mediação e criatividade se vão encontrando soluções para a indisciplina escolar, com oferta de boas oportunidades académicas e não-académicas, com um vasto leque de actividades positivas de desporto e de ocupação de tempos livres.
Finalizo com as palavras do pedopsiquiatra Pedro Strecht, “Qualquer criança ou adolescente tem em si mesmo a possibilidade de vir a ser muitas coisas. Depende de nós”.
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