Todos ouviram falar, alguns conhecem histórias e as autoridades investigam certas redes, mas ninguém arrisca o número de casamentos por conveniência ("brancos") entre portugueses e cidadãos não comunitários para que estes últimos se possam legalizar em Portugal ou em outro país da UE. Existe apenas uma certeza: "Os números estão a crescer."
A primeira dificuldade na obtenção de dados deve-se ao facto de este tipo de casamentos não ser considerado crime (será alterado na nova lei da imigração), sendo os casos suspeitos investigados no âmbito do auxílio à imigração ilegal. A segunda é que muito matrimónios se realizam no estrangeiro e as pessoas "esquecem-se" de os registar em Portugal.
O Instituto Nacional de Estatística indica uma duplicação dos casamentos mistos (nacionais e estrangeiros), passando de 1698 (2000) para 3540 por ano (2004). Ultima- mente, são os portugueses a preferir esposas de outras nacionalidades, quanto anteriormente eram as portuguesas que mais casavam com estrangeiros. Regista-se um aumento substancial de uniões entre homens nacionais e brasileiras (de 271 para 1165 por ano) e triplicaram os matrimónios de portugueses (sobretudo do sexo masculino) com os oriundos da Europa não comunitária. Sabe-se que o Brasil e os países da Europa de Leste constituem o fluxo recente da imigração, mas é abusivo concluir que todo este aumento significa casamentos brancos.
Arriscar a vida
As polícias dos diferentes países, nomeadamente o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), trocam informações e é desta forma que se chega às mulheres que se arriscam a viajar para um país sem conhecerem quem as recruta, a língua e o local para onde vão, para receberem menos de três mil euros. Ou menos, já que nem sempre lhes dão o prometido.
Muitas vezes, estas raparigas escondem a viagem da família. E se desaparecerem ou forem desviadas para uma rede de tráfico de seres humanos, será difícil seguir-lhes o rasto.
Estes são os casos que mais preocupam as polícias. "Apercebemo-nos que há zonas de risco, grupos ou redes que fomentam este tipo de negócio e em que se nota uma certa organização. As autoridades portuguesas começaram a perceber que este não era um problema só nosso, mas de toda a Europa. Os números começam a crescer", sublinha o inspector Joaquim Pedro, chefe de divisão da Direcção Central de Pesquisa e Análise de Informação do SEF.
"O fenómeno está em crescimento no seio de várias comunidades imigrantes, nomeadamente da cabo- -verdiana [mas com nacionalidade portuguesa]", diz a investigadora do Instituto de Ciências Sociais Marzia Grassi. Explica que as redes transaccionais servem-se das mulheres "mais pobres que, em virtude da fragilidade das suas condições de trabalho, da falta de apoio familiar e da fraca inserção na sociedade de acolhimento, são recrutadas para casar com estrangeiros para estes se movimentarem no espaço Schengen". É autora do trabalho "Casar com o passaporte no espaço Schengen: uma introdução ao caso de Portugal", uma investigação da UE coordenado pela Universidade de Florença.
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